sexta-feira, 15 de maio de 2015

Livros e Viagens - Gonçalo Cadilhe

Todos temos os nossos heróis. Alguns são heróis de toda a gente; não conheço ninguém que não admire Martin Luther King ou Gandhi. Mas, depois, há os outros. Os nossos heróis pessoais, aqueles que, sendo pessoas comuns, admiramos mais abertamente ou mais secretamente, numa admiração feita de sonhos repartidos ou afinidades e identificações inesperadas.
Gonçalo Cadilhe está nessa minha prateleira dos heróis pessoais. Porquê? Talvez porque, aos vinte e quatro anos, teve a coragem de virar as costas a um curso e um emprego para perseguir um sonho: viajar. Não o posso fazer, nunca pude, nunca poderei. Sempre houve outras urgências e contingências que condicionaram a minha vida, como a da maior parte das pessoas. Admiro-o por isso. Mas há outras razões.
Gonçalo Cadilhe escreve livros de viagens, das viagens que faz. Não são simples descrições de lugares, são esboços emocionais. Porque os lugares agem sobre nós e tornam-nos diferentes. E nós também agimos sobre os lugares, porque não os vemos sempre com os mesmos olhos.

Não é verdade que o planeta seja redondo. É armilar. Anda-se às voltas e nunca se regressa ao mesmo sítio. A estrada, sim, passa por lá; mas o tempo também passa, e leva de nós o que fomos antes. Falta-nos o mesmo momento para podermos regressar ao mesmo sítio. Regressamos já outros, e compreendemos que o sítio já não é o mesmo.
                    (Gonçalo Cadilhe "1 Km de cada vez")

O primeiro livro que li de Gonçalo Cadilhe foi "Planisfério Pessoal", onde são reunidas as crónicas que escreveu e foi publicando no jornal Expresso, enquanto fazia uma volta ao mundo muito peculiar: numa época de aceleração, em que tudo se tem de fazer rapidamente, Cadilhe optou por dar a volta ao mundo sem pôr os pés num avião. Isto significou percursos lentos, em transportes alternativos, camionetas, navios cargueiros. Teve experiências inesperadas, conheceu pessoas diferentes, que geralmente não protagonizam livros de viagens.
Depois desse, li vários outros livros dele. Li-os num ápice e depois, de vez em quando, releio uma passagem, um capítulo. Relembro um local, com pessoas e sensações e pequenas histórias, lá dentro. Vou lendo, saboreando cada pequeno capítulo, cada apontamento de uma viagem que parece sem rumo, mas com muito sentido. Leio outros livros pelo meio, e depois volto. Porque não há maior liberdade do que viajar ao sabor do tempo.

Vem esta crónica a propósito de uma exposição, patente a partir de hoje no Museu do Oriente, onde Gonçalo Cadilhe expõe fotografias das suas viagens, das voltas do seu planisfério pessoal. Intitula-se Um dia na Terra - Fotografias do Quotidiano do Planeta. Eu não vou perder com certeza.

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